domingo, 3 de janeiro de 2010

Bordwell

"Nos anos 1950, Bazin e seus colegas mais jovens poderiam considerar o cinema americano um baluarte da encenação cinematográfica sutil. No geral, hoje, já não é assim. O cinema que se vê em Hollywood é tão diferente de Bauer, Hong Sang-soo e mesmo Hawks que esses diretores parecem excêntricos e antiquados. As modalidades estilísticas tratadas neste livro desafiam pacificamente o modo mais habitual de fazer e olhar cinema."

"Apesar de os críticos reclamarem que os filmes estão repletos de corridas, explosões e tiroteiros, a cena padrão continua sendo a conversa. Essas cenas são dominadas por duas normas da prática da encenação cinematográfica: "levanta e fala" e "anda- e-fala". Ambas florescera, no cinema clássico de estúdio, mas entre esses extremos, também havia a coreografia de jejum de amor (v. quadro). Hoje, esse jogo intermediário praticamente desapareceu. Em vez disso, os cineastas desenvolveram métodos de edição e movimentos de câmera que dão andamento a diálogos parados ou conversações em atividade."

"Na abordagem "levanta-e-fala", que pode se tornar "senta-e-fala", os personagens aparcem tomando posições, geralmente num plano-sequência. Um eixo de ação governa as orientações e linhas de olhar entre atores, e as tomadas, embora variadas em ângulo, são filmadas de um mesmo lado do eixo. Os movimentos dos atores são coordenados pelos cortes. À medida que a cena se desenrola, os planos tendem a se aproximar dos atores, levando-nos para o âmago do drama. A montagem analítica apresenta campo/contracampo, ângulos na altura dos ombros e planos únicos - tudo que se exige para seguir os códigos tradicionais da montagem da continuidade clássica. Quando os personagens mudam de posição dentro do espaço, aparece um novo plano geral para nos informar."

"Não importam as variações ou alternativas que possamos encontrar, esses esquemas são quase um segunda natureza para os cineastas. "Se tudo o mais falhar", diz Ron Howard a um diretor novato, "filme um plano-sequência, algumas tomadas na altura dos ombros e planos únicos". O mesmo conselho poderia ter sido dado em 1925. A diferença báscia é que, em 1930, uma cena como a de Jejum de amor, de Hawks, poderia integrar a montagem analítica como uma coreografia complexa. No cinema contemporâneo, a estratégia do "levanta-e-fala" domina. Tendo colocado os atores em seus lugares, os diretores dinamizam os diálogos pela montagem e por outros artifícios cinematográficos. Chamaremos esse novo estilo, que emergiu nos anos 1960 e se difundiu enormemente nos anos 1980, de continuidade intensificada."


E para os que precisarem de maiores esclarecimentos:


"(...) Aqui, eu me separo de Bazin e dos críticos dos Cahiers: a imagem cinematográfica nos dá uma projeção em perspectiva, mas essa projeção não precisa filmar um mundo preexistente."

"Uma vez que a encenação cinematográfica já não precisa captar um bloco de espaço-tempo independente, não podemos julgar o valor artístico baseados na fidelidade à realidade. (...)"



"Figuras traçadas na luz - A encenação no cinema" - David Bordwell
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